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Conto de Natal

Posted by Arthur on 02:33 in , , , , ,
Na 24° noite do 12° mês, Sérgio estava sentado à beira da piscina esperando alguém ligar. Apenas 16 anos e um pouco mais de 16 amores iludidos. Ensaiou alguns acordes no violão de cordas de nylon. "Corda de nylon é tão bossa nova", ele gostava de pensar. Não condiz com a imagem rebelde de cabelo sujo tão em voga na turma. Sérgio não tinha nenhuma identidade falsa pra poder entrar na festa de natal da boate do centro. Também não tinha nenhum parente na capital. Seus amigos todos estavam com suas famílias e os colegas de rep estavam no interior, mas ele tinha escolhido ficar na cidade com sua namorada. Ex-namorada, agora que ela está dando pro Diego Loyola do 3°E. Cansou da frequência da corda Mi e passou a palhetar exclusivamente o La. Quase achou graça quando percebeu que o 'tuu' do telefone é um La.

Ninguém tinha ligado ainda. Nem mesmo um SMS.

Sérgio pegou a carteira e foi ver como as coisas estavam na rua. Tava tudo bem parado. De vez em quando passava um carro com um motorista visivelmente embriagado. "Porque as pessoas bebem tanto no natal?". Ele preferia beber em qualquer outra noite do ano que não aquela em que ele fica conversando com a vó Nicinha. Se bem que podia ser esse o motivo: as pessoas bebem pra aguentar a chatice alheia.

Sérgio estava cruzando a avenida Marechal Deodoro quando um Vectra cinza derrapou em um saco de lixo estourado que sujava a pista. Provavelmente era fruto da inadimplência de algum catador de lixo que, apressado para chegar em casa e ter tempo de assistir o especial de natal do Shrek bebendo vinho Mioranza com a esposa e 3 filhos, não voltou para buscar o saco que caiu de suas mãos. Sérgio até entendia, ia ser foda o cara voltar pra pegar o saco caído e depois ter que correr atrás do caminhão de lixo naquela noite fria em que cada inspirada parecia cortar narinas, garganta e pulmão.

A vida de Sérgio não passou relampejando em sua cabeça. Ele teve tempo de pensar em tudo isso que foi escrito, mas foi só. Não lembrou de quando era criança nem nada. Não pensou em nenhuma das pessoas que não ligaram pra ele na noite de natal. Honestamente, na hora ele tava mais ocupado pensando no pacotão de contratações do São Paulo. Acabou que ele morreu mesmo pensando se o Cortês tinha sido uma boa contratação para o Tricolor ou não. Este motorista não estava bêbado. Era um senhor de camisa azul clara.

Enquanto os paramédicos constatavam que não restava nada a fazer, um monte de mensagens e alertas de chamadas perdidas começaram a chegar no celular de Sérgio. É que as operadoras ficam bem sobrecarregadas na noite de natal.

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Juras a ti, ó amada metalinguagem!

Posted by Arthur on 20:52 in , ,
Tenho escrito muito pouco
Tenho estado meio rouco
Sendo taxado de louco
Por gente que não me interessa.

Já não mando mais mensagem
Já não faço homenagem
Me dou mal na vadiagem
Mas leio o que ela confessa.

Não vejo mais nenhum charme
Em resmungar com alarde
Em escrever ao desarme
Me contento com essa peça

Não conto sílabas anônimas
Não procuro versos homônimos
Melhor ser assim tão lacônico
Amando figuras de linguagem.

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